Saudade
Não foi desta, afinal, que a matei.
A minha saudade de ti.
Não falo da saudade que se mata quando nos cruzamos, ocasionalmente, no 'sítio do costume', quando trocamos olhares, quando te lanço um 'olá, estás boa?' entre dentes. Não. Falo da saudade que se mata quando passamos tempo juntos, quando estamos só os dois, quando sinto que só nós existimos, e que nos bastamos um ao outro. Da saudade que renasce assim que nos separamos, e que exige um reencontro tão brevemente quanto possível.
Não falo da 'nossa saudade', porque, como sabes, não acredito que a sintas. Pelo menos da forma que eu a sinto. A verdade é que nunca me procuras, nunca dás o primeiro passo. Tenho de ser sempre eu a ir ao teu encontro.
Estou a ser um pouco injusto, eu sei. Desculpa...
Tenho plena consciência das tuas limitações, daquilo que te prende e te impede de agir, de tomar a iniciativa. E, sim tens razão, ultimamente também não te tenho procurado. Pelo menos não da forma que o fiz em tempos.
Em 2003, lembras-te? Fim da Primavera, princípio do Verão.
Acho que foi a nossa 'época áurea'. Apesar de todas as 'voltas' que demos antes, acho que nunca foi tão bom como nesses meses.
Aproveitávamos as noites quentes, quando só se estava bem na rua (especialmente quando corria uma aragem), para dar os nossos passeios 'por aí'. Só os dois, na maior parte das vezes. Encontrando amigos comuns aqui e ali, noutras. As caras deles quando nos viam! Nunca percebi a causa de tanto espanto.
Achas que as podemos 'reeditar', a essas noites? Ou até mesmo as tardes em que nos aventurámos a sair juntos? Sinto falta desses nossos momentos, sabes? Sinto que preciso de os voltar a viver. Fizeram-me muito bem...
Alguma vez te contei que foi contigo que gastei boa parte, senão mesmo a maior parte, do meu primeiro ordenado? Acredita que é verdade! Tal como também é verdade que já nos conhecemos há tanto tempo assim. Fez 11 anos em Janeiro. Um terço da minha vida, praticamente. E toda a tua, mais mês menos mês.
Uns bons 70 contos, se não me falha a memória.
E não eras topo de gama. Não eras uma Iguana, como todas as outras do pessoal.
Apenas uma modesta Granite City. Giant Granite City.
Mas para mim eras mais que suficiente. Eras linda. E ainda és, apesar das manchas de óleo e do pó acumulado. Foste uma excentricidade, um pequeno luxo, o primeiro que me saíu da pele. E que bem que soube. Que soubeste.
Nunca te dei, infelizmente, todo o uso que pretendia dar, nem sempre cuidei de ti como devia. Muito chiaste tu, durante anos e anos, à conta dos calços dos travões e da sua desafinação, até ires parar, por empréstimo, às mãos do Pedro, que te pôs em condições.
Mas agora... é como te digo: sinto falta de ti.
Do exercício. Do anti-stress.
Que me dizes? Aceitas o desafio?
Sentes-te em condições para voltares ao activo?
Enchemos-te os pneus, lubrificamos-te e fazemo-nos ao mundo.
Vamos ao Estádio Nacional, ao Monsanto, a Sintra.
Fazemos a Marginal, para um lado e para o outro.
Do Parque das Nações ao Guincho!
E então? Aceitas-me de volta?
Posso voltar a montar-te, a segurar-te pelos cornos e a acelerar contigo?
É já a seguir?
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